Sempre fiz da mesma forma desde há 30 anos, porque é que tenho de fazer diferente?

Num café junto à escola onde lecciono há mais de duas décadas, ouvi uma conversa que me fez reflectir profundamente sobre o estado actual do ensino em Portugal. Um empresário local, daqueles que se orgulham das conquistas do passado, proclamava aos quatro ventos: "Sou empresário e sempre fiz da mesma forma desde há 30 anos, porque é que tenho de fazer diferente?" Esta frase, aparentemente desligada do contexto educacional, ecoa de forma perturbadora nos corredores das nossas escolas, onde por vezes ouvimos discursos semelhantes da parte de alguns colegas professores.






A verdade é que esta mentalidade de resistência à mudança tem vindo a criar um fosso cada vez maior entre a educação que oferecemos e aquela de que os nossos alunos verdadeiramente necessitam. Vivemos numa era em que a informação flui a uma velocidade vertiginosa, em que os nossos alunos nasceram já completamente integrados num mundo digital, e ainda assim, persistimos em metodologias e práticas pedagógicas que remontam ao século passado. É como se tentássemos ensinar a conduzir um carro moderno usando o manual de instruções de uma carroça - simplesmente não faz sentido.


Os currículos e programas educativos em Portugal têm evoluído, ainda que por vezes de forma tímida, mas a verdadeira questão reside na forma como nós, professores, os implementamos na sala de aula. Não basta termos quadros interactivos se continuamos a usá-los como se fossem quadros de giz. Não é suficiente falarmos de competências para o século XXI se continuamos presos a métodos de avaliação que privilegiam apenas a memorização. A mudança não pode ser apenas cosmética, tem de ser estrutural, começando pela nossa própria mentalidade enquanto educadores.


Quando olhamos para os países com os sistemas educativos mais bem-sucedidos, encontramos invariavelmente professores que não têm medo de inovar, de experimentar novas abordagens, de falhar e voltar a tentar. São profissionais que entendem que a educação é um organismo vivo, em constante evolução, e que o nosso papel não é ser meros transmissores de conhecimento, mas sim facilitadores de aprendizagem. Esta mudança de paradigma exige coragem, trabalho e, acima de tudo, vontade de sair da nossa zona de conforto.


A adaptação aos novos currículos e programas não pode ser vista como um fardo administrativo adicional, mas sim como uma oportunidade de reinvenção das nossas práticas pedagógicas. Os nossos alunos de hoje não são os mesmos de há 30 anos, tal como o mundo para o qual os estamos a preparar também não o é. Se continuarmos a ensinar como sempre ensinámos, estamos a preparar os nossos alunos para um mundo que já não existe. A tecnologia, as redes sociais, a inteligência artificial - tudo isto são realidades que não podemos ignorar e que devem ser integradas de forma inteligente e criteriosa no processo de ensino-aprendizagem.


É certo que a mudança assusta. É mais confortável manter-nos no conhecido, no seguro, naquilo que sempre funcionou - ou pelo menos que achamos que funcionou. Mas quando olhamos para os níveis de insucesso escolar, para o desinteresse crescente dos alunos, para a falta de ligação entre os conteúdos leccionados e a realidade do mundo actual, percebemos que algo tem de mudar. E essa mudança começa em cada um de nós, na nossa disposição para aprender, para nos actualizarmos, para arriscarmos fazer diferente.


Tal como aquele empresário no café, também nós podemos escolher ficar há espera da insolvência ou de qualquer outra fé dívina da salvação económica, agarrados a métodos e práticas do passado, convencidos de que o que o melhor está para vir. Ou podemos escolher ser agentes de mudança, contribuindo para uma educação mais dinâmica, mais relevante e mais capaz de preparar os nossos alunos para os desafios do futuro. No final, tudo se resume a uma escolha, porque afinal, quem quer faz, quem não quer arranja desculpas.

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